quarta-feira, 26 de março de 2008

O mito de Ifigénia em Eurípides

Em Áulide, não há ventos favoráveis. Agamémnon, incitado pelo exército que quer vencer e ameaçado o seu posto de chefia, sujeita-se a sacrificar a sua querida filha. Para tal, ordena a sua vinda do Palácio ao engano, dizendo-lhe que viria ali para desposar Aquiles, herói que nada sabe.
A peça inicia-se com um Agamémnon fraco e arrependido, que tenta enviar um ancião para revelar a verdade e impedir a chegada de Ifigénia. Porém, esta tentativa não teve qualquer êxito. A jovem chega e assistimos a uma enorme tensão com o exército e revolta de Aquiles.
Quando a acção parece alcançar um impasse, Ifigénia caminha voluntariamente para o sacrifício, num gesto de coragem e abnegação, que simboliza o sangue dos inocentes, dos ainda puros e não pervertidos, que redime as incongruências dos grandes chefes.
É este sangue que, no último momento, de uma forma inexplicável, os deuses não aceitam. Ártemis faz desaparecer Ifigénia, e em seu lugar coloca uma jovem corsa para o sacrifício.
Assistimos, então, a um final inesperado, em que a intervenção dos deuses poupa o ser humano de situações pouco aceitáveis. O sacrifício de um inocente permite a percepção do excesso.
Uma tragédia forte que não se pode deixar de ler!

sábado, 22 de março de 2008

Dia Mundial da Poesia

Quando escrevo este post, já terminou o dia dedicado à celebração da Poesia. Porém, só agora tive disponibilidade para escrevinhar algumas linhas sobre esta forma literária que nos transporta para um mundo diferente, onde podemos sonhar, reflectir e viver. Sim, porque a Poesia é, muitas vezes, o espelho da alma do seu autor, mas também do ser humano que se dedica ao prazer da sua leitura. A verdadeira mensagem só o poeta a conhece, só ele sabe porque usou determinada palavra, enfim, só ele sabe explicar porque modelou o texto poético daquele modo...mas a pluralidade de significações atribuídas pelos leitores contrói um puzzle que enriquece a Poesia.
Desfrutem este poema:
"Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.
eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.
Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.
Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança."
(António Gedeão, Pedra Filosofal)